Ônibus elétrico em Feira de Santana mostrou eficiência, mas custo alto afasta realidade das empresas - Foto: Ed Santos/Acorda Cidade

Ônibus elétrico em Feira de Santana mostrou eficiência, mas custo alto afasta realidade das empresas

Feira de Santana Mobilidade urbana Tecnologia

Os ônibus elétricos de fabricação chinesa abriram debate sobre transporte público sustentável na cidade, mas falta incentivo para transformar experiência em prática

Durante algumas semanas, quem circulou por Feira de Santana teve a oportunidade de andar em um ônibus diferente. Silencioso, sem fumaça, com aceleração suave. Era um modelo elétrico, fabricado na China, colocado à disposição da cidade em caráter experimental. A ideia era simples: mostrar como funcionaria, na prática, um transporte coletivo ambientalmente adequado.

Do ponto de vista técnico, o teste foi aprovado. O veículo cumpriu bem a função de rodar em linhas urbanas, transportando passageiros com conforto. Mas, ao final da experiência, uma constatação inevitável se impôs: colocar ônibus elétricos de forma permanente nas ruas ainda está muito longe da realidade local.

O secretário de Mobilidade Urbana, Sérgio Carneiro, foi direto ao explicar o que trava a adoção desses veículos. “O valor é o grande empecilho. Com o que se paga em um ônibus elétrico, as empresas compram dois ou até três movidos a diesel. E esses veículos podem ser espalhados por várias linhas, não apenas em uma rota”, disse.

O custo não se resume ao veículo em si. Para que o sistema funcione, seria necessário instalar pontos de recarga, adaptar garagens e treinar equipes de manutenção. Um pacote de investimentos que, para empresas que já enfrentam queda no número de passageiros ano após ano, soa como inviável.

“Estamos falando de milhões de reais. Recuperar esse dinheiro levaria muito tempo, e o transporte público não tem conseguido sequer manter o equilíbrio financeiro. É preciso que exista uma política de incentivo”, completou o secretário.

Ônibus elétrico em teste nas ruas de Feira de Santana - Foto: Ed Santos/Acorda Cidade
Ônibus elétrico em teste nas ruas de Feira de Santana – Foto: Ed Santos/Acorda Cidade

Feira de Santana não foi a única a testar o ônibus elétrico. A iniciativa surgiu do Fórum Baiano dos Secretários de Mobilidade, presidido por Pablo Souza, secretário de Salvador. A articulação com fabricantes viabilizou a circulação temporária do veículo em cidades como Camaçari, Jequié, Vitória da Conquista, Luís Eduardo Magalhães e na própria capital baiana.

Em todas elas, a avaliação técnica foi semelhante: o desempenho é bom, mas o preço segue como barreira. Ou seja, o problema não está no ônibus em si, mas em como viabilizar sua presença de forma estável e acessível.

Mobilidade precisa ser prioridade

Na visão de Sérgio Carneiro, a questão vai além da economia das empresas. Ele defende que a mobilidade urbana seja tratada pelo Governo Federal como prioridade nacional, assim como já acontece com saúde, educação e segurança.

Ele sugere a criação de um Fundo Nacional de Mobilidade Urbana, capaz de oferecer subsídios às cidades que quiserem modernizar suas frotas. “O governo concede benefícios bilionários à indústria automobilística tradicional. Por que não destinar parte disso para incentivar o transporte coletivo sustentável? Estamos falando do direito de ir e vir das pessoas, mas de forma adequada ao meio ambiente”, argumentou.

Passageiros em queda, pressão em alta

O transporte público no Brasil enfrenta uma crise que não é de hoje. Dados de entidades nacionais mostram que, desde a pandemia, o número de passageiros não voltou aos níveis anteriores. Em Feira, essa realidade se repete: cada vez menos pessoas utilizam ônibus diariamente, migrando para motocicletas, carros por aplicativo ou mesmo bicicletas.

Isso significa menos receita para as empresas e mais dificuldade para manter a frota em condições adequadas. Nesse cenário, pensar em comprar ônibus que custam milhões soa como um sonho distante.

“É um dilema. Todo mundo gostaria de ver ônibus elétricos circulando, mas as empresas estão preocupadas em pagar a folha, em manter a operação funcionando. É preciso compartilhar essa conta”, disse um empresário do setor, em reserva.

Apesar das dificuldades financeiras, não dá para ignorar os benefícios ambientais de uma frota elétrica. Hoje, os ônibus movidos a diesel são grandes responsáveis pela emissão de gases poluentes e pelo agravamento da qualidade do ar nas cidades.

Especialistas lembram que, em municípios médios como Feira de Santana, a troca para veículos menos poluentes teria impacto direto na saúde da população, reduzindo problemas respiratórios e melhorando a qualidade de vida. Além disso, o transporte coletivo sustentável poderia atrair de volta parte dos passageiros que deixaram o sistema nos últimos anos.

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Enquanto a chegada dos elétricos parece distante, outras alternativas vêm sendo debatidas. Uma delas é o uso de ônibus híbridos, que combinam motor a combustão com propulsão elétrica, reduzindo a emissão de poluentes sem custar tanto quanto os modelos totalmente elétricos.

Outra opção é ampliar o uso de combustíveis renováveis, como o biodiesel, já presente de forma parcial na frota nacional. Essas soluções não resolvem completamente o problema ambiental, mas podem ser passos intermediários até que os elétricos se tornem mais acessíveis.

Ônibus elétrico desafio em Feira de Santana

Feira tem um papel estratégico quando se fala em transporte. É o maior entroncamento rodoviário do Norte-Nordeste e concentra grande fluxo de pessoas e mercadorias. Um sistema de transporte coletivo moderno e sustentável poderia ser também um cartão de visitas para a cidade, que busca consolidar sua imagem como polo regional.

Mas, por enquanto, a cena do ônibus elétrico circulando pelas ruas ficou restrita à lembrança de quem viu a experiência de perto. O teste foi importante para mostrar que é possível. Falta agora transformar essa possibilidade em política pública e em realidade concreta.

O episódio do ônibus elétrico em Feira de Santana não pode ser visto apenas como uma curiosidade passageira. Ele expôs de forma clara os desafios que o país enfrenta quando se fala em mobilidade sustentável. A tecnologia existe, está disponível, mas precisa de condições para ser implantada.

“Não se trata de querer ou não querer. Trata-se de viabilizar. Sem apoio governamental, dificilmente veremos ônibus elétricos rodando permanentemente por aqui”, resumiu o secretário Sérgio Carneiro.

Enquanto a discussão segue, a população continua dependendo dos ônibus a diesel, com todos os impactos que eles trazem para a cidade e para o meio ambiente.

Feira de Santana já deu o primeiro passo ao abrir espaço para o teste de um ônibus elétrico. A experiência serviu para mostrar que o transporte sustentável é viável do ponto de vista técnico, mas distante financeiramente.

Seja por meio da criação de fundos, de subsídios diretos ou de políticas públicas mais amplas, o fato é que o futuro da mobilidade depende de escolhas feitas hoje. Sem isso, os ônibus elétricos continuarão sendo apenas visitantes ocasionais nas ruas da cidade, em vez de parte do cotidiano de milhares de passageiros.

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